22 de novembro de 2009

A do caso do vestido

Algum tempo hesitei se deveria escrever sobre o caso Geisy. Temia chover no molhado, fazer com que meu texto fosse só mais um sobre um assunto já saturado. Pensei que isso era inevitável, enfim. E, tendo em vista os últimos acontecimentos sobre a garota, achei pertinente comentá-los aqui.

Quando Geisy foi escurraçada naquele Carandiru-niban, a defendi de verdade a todos os que achavam que ela tinha merecido. Vieram à minha cabeça aquelas acusações infundadas que fazia-se a mulheres estupradas: "Mas, também, ela provocou, não podia estar vestida daquele jeito..." Li com total compreensão os gringos atônitos, tentando explicar o caso: "Apesar de o Brasil ser conhecido pelas vestimentas escassas, nas cidades em que não há praia as jovens costumam se vestir mais casualmente, com jeans e camiseta". Cheguei a pensar que Geisy era uma espécie de Bettie Page, julgada por conservadores em uma época em que usar pouca roupa era imoral e obsceno, com a diferença de que não estamos mais nessa época e de que sediamos a festa mais nua e obscena do mundo, sem o menor choque.

Por que então o vestido de Geisy foi objeto de tamanho bafafá? Em qualquer balada de São Paulo podemos encontrar pessoas vestidas assim. No Rio, encontramos gente vestida com roupas ainda menores (nem decote o vestido da menina tinha!). Mas, depois da indignação, veio a raiva. Geisy no Casseta e Planeta, Geisy dizendo que leiloará o vestido e, a gota d'água: Geisy posando nua. De vítima, ela passou a palhaça.

Não que eu condene quem posa nua. É uma opção. Uma opção que compra apartamentos luxuosos. O problema é toda a publicidade que se fez em torno disso. Geisy é muito jovem e, aqui entre nós, não é a pessoa com o futuro mais brilhante estudando na Uniban (e deixo bem claro que não quero dizer que quem faz Uniban não tem futuro, mas sim que terá que penar muito mais do quem fez uma faculdade de ponta, e isso é fato). Aproveitar-se de uma situação como a que ela vivenciou, tentando fazer do trauma um caça-níquel, é não só ridículo como tão machista quando as pessoas que a escurraçaram. Antes, ela mostrava o corpo como uma opção de liberdade feminina. Agora, ela mostra para ganhar dinheiro.

É verdade que Geisy ainda não confirmou se vai ou não posar nua. Mas tanto a Playboy quanto a Sexy já declararam que irão procurá-la. É questão de tempo (e dinheiro) até ela aceitar. Enquanto isso, ela fica fora da faculdade, mostrando seu nome nos quatro cantos da TV e da internet.

A dura verdade disso tudo é que, ao invés de mostrar ao país o quanto ainda precisamos progredir em direitos femininos, em educação, e principalmente em respeito ao próximo, ela está usando as mesmas velhas armas de qualquer mulher que começa a receber mais atenção. O que ela não percebeu é que sua vida se transformou em um Big Brother universitário, de um só participante, com o pacote completo pós-saída da casa: Faustão, Paparazzo, Playboy, Programa do Jô, Mais Você, Hebe, Superpop, esquecimento.

16 de novembro de 2009

A da volubilidade

Atire a primeira pedra quem não é volúvel neste mundo. Melhor: redija o primeiro comentário ofensivo quem não é portador desse fino traço de volubilidade. Pensando bem, quem acreditar não ser volúvel, que pense melhor no assunto amanhã para ver se não muda de ideia. Porque todos nós mudamos de ideia uma vez ou outra, e sabemos no fundo que não temos muita certeza se essa "vez ou outra" não é corriqueira demais.

Machado de Assis tratou esse tema fielmente em diversos contos. Em "D. Benedita", por exemplo, descreve uma senhora tão indecisa da vida que não consegue completar nenhum plano, fazer uma única resolução. Não estou dizendo que sejamos todos assim. Mas é bem provável que tenhamos fases da vida com idas e vindas.

O vestibular é a mais vil prova de volubilildade a que um ser humano pode se submeter. Escrever em um papelzinho sua opção de "carreira"? Quando prestei vestibular eu mal sabia o significado dessa palavra, quanto mais se estava certa da minha opção! Conheço várias pessoas que mudaram o número da tal "carreira" da Fuvest na fila de inscrição. Uma verdadeira crueldade essa história de vestibular.

"Mas você está falando de decisões importantes", vocês podem argumentar. As decisões importantes são realmente as mais difíceis, mas não são as únicas formas de exercermos nossa volubilidade. A indecisão passa também pelo prato que pedimos no almoço, pelo corte de cabelo, roupa que iremos vestir e por aí vai. O fato é: não ofereça uma lista muito grande de opções a uma pessoa. Fatalmente ela irá surtar.

Mais exemplos de volubilidade? Twitter. Siga uma pessoa qualquer que costume narrar seu dia inteiro lá. Veja quantas vezes ela ficará em dúvida e mudará de ideia. Sim, porque ser volúvel não é apenas ficar em dúvidas, deixo bem claro. É principalmente mudar de rumo sem muito porque, simplesmente porque quer. No Twitter as pessoas adoram expressar suas idas e vindas.

Porém devo ser justa: sendo todos nós volúveis e não existindo nada nesta vida que seja definitivo, a volubilidade não é assim tão ruim. Muito pior seria ter não ter o direito de mudar de ideia, ou ainda ter tão poucas possibilidades que as escolhas limitadas sequer poderiam gerar dúvidas. Imaginem um cardápio de um prato só, uma universidade de um só curso, roupas únicas, cortes de cabelo padronizados... Que tedioso seria o mundo da involubilidade! Pessoas presas em decisões que não tomaram ou que foram obrigadas a tomar. Uma ditadura sem ditadores. Que seria deste post sem a volubilidade, afinal? Um brinde à volubilidade, meus leitores, um brinde ao motor da vida - mais um assunto chato para este blog.